Apesar das vantagens na integração de cadastros usados em políticas públicas, dificuldades políticas, orçamentárias, técnicas e éticas devem ser superadas

 

Kathy Lindert, do Banco Mundial, Luís Henrique Paiva, do IPC-IG, e Valentina Barca, de Oxford

Brasília, 5 de abril de 2016 – Para os países que buscam desenhar programas eficientes de proteção social e atender à população de forma efetiva, a integração de bases de dados será “o desafio dos próximos 10 anos”, na avaliação de Kathy Lindert, economista chefe para Proteção Social e Trabalho do Banco Mundial, que debateu o assunto com gestores e especialistas do Brasil e do mundo no Seminário Internacional de Integração de Bases de Dados e Sistemas de Informação para Aperfeiçoamento de Políticas Públicas, realizado nos dias 5 e 6 de abril em Brasília.

Apesar de salientar o sucesso do Brasil na construção do Cadastro Único para Programas Sociais, desde 2001, a economista avalia como a maior prioridade do país a interoperabilidade com outros sistemas de cadastros públicos, movimento que vem sendo efetivado com sucesso por nações como Austrália, Chile e Argentina. O termo interoperabilidade é usado quando entidades independentes de um mesmo governo podem se comunicar e funcionar em sinergia ao compartilhar informações na tomada de decisões.

Os benefícios desta integração atingem os formuladores de políticas públicas, as agências locais e os cidadãos, pois permite a visualização precisa dos beneficiários de programas sociais, elimina esforços duplicados em manutenção de sistemas e, para os cidadãos, diminui a burocracia na comprovação das mesmas informações a diversos órgãos, por exemplo.

Veja mais detalhes da apresentação de Kathy Lindert (em inglês)

Para a consultora da Oxford Policy Management, Valentina Barca, a implementação de cadastros integrados requer sobretudo arranjos políticos e institucionais, embora muitas vezes a ênfase seja dada às dificuldades técnicas.

“O objetivo final é sempre compartilhar informação, tomar decisões e melhorar o padrão de vida no país. Então é preciso aceitar que o processo é lento e que erros serão cometidos, mas depois ajustados”, afirma a pesquisadora. Segundo Valentina, mesmo o melhor e mais abrangente dos sistemas não é suficiente se não puder converter os dados em informação útil no desenho de políticas públicas.

“Quem passou por esse processo recentemente colocou ênfase forte na análise dos dados e sua utilidade”, afirmou ela no seminário realizado pela Secretaria Nacional de Renda de Cidadania (Senarc) do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) em parceria com a Iniciativa Brasileira de Aprendizagem por um Mundo sem Pobreza (WWP).

Segundo Valentina, que já se debruçou sobre o caso de mais de 40 nações na integração de base de dados nacionais, não adianta querer que todas informações estejam disponíveis: é preciso estabelecer prioridades para começar.

Leia a análise da consultora italiana Valentina Barca (em inglês)

Desafios

As trocas de experiências exitosas de integração, um dos objetivos do encontro, mostram que os custos são barreiras relevantes na hora de compartilhar responsabilidades entre as diversas instituições públicas.

“No Brasil, por exemplo, o MDS está pagando pelo Cadastro Único, mas muitos outros o utilizam. Quem deve arcar com os custos de sistemas com múltiplos usuários?”, questiona Kathy Lindert, sobre a dificuldade encontrada por muitos países para integrar, manter e expandir os sistemas de informação.

Outra questão primordial é a privacidade e uso dos dados. Nas integrações efetuadas em países como Chile e Argentina, além das informações de seguridade social e o histórico laboral, pode-se acessar informações tributárias. Entre as soluções apontadas pelas especialistas no painel de discussão, está a partilha seletiva de dados entre as agências, com protocolos de segurança que estabeleçam o quanto cada órgão precisa, com diferentes níveis de acesso e identificação do funcionário que atua com as informações.

Embora necessário, deve haver ainda relativa cautela em relação à atualização contínua e o controle centralizado do cadastro no regime federal, na avaliação de Valentina Barca.

“Existe o perigo da exclusão sistemática de algumas famílias por problemas na coleta de dados. Nos requerimentos para identificação nacional, os mais pobres são também os mais excluídos e uma abordagem apenas nacional não reflete normalmente os cenários locais”, alerta a consultora.

No caso brasileiro, um sério complicador à integração é a falta de um identificador civil único, já que o registro civil é uma atribuição dos estados. O Cadastro Único do país, portanto, aparece como um sucesso por ter superado este panorama, mas a interoperabilidade com as demais bases de dados é um desafio.

“Não há nenhuma medida totalizante ou imediata que possamos fazer. A integração está em nossa agenda há muito tempo, e o resolveremos passo a passo, em agendas bilaterais e multilaterais”, afirmou a Diretora do Departamento do Cadastro Único do MDS, Joana Mostafa.

Veja a apresentação de Joana Mostafa aos participantes do seminário

Marco Prates, WWP