Estudo inédito do Banco Mundial mostra que a pobreza diminuiu 68,8% entre 2004 e 2012 nas regiões metropolitanas do país
Brasília, 9 de julho de 2015 – A redução da pobreza no Brasil foi maior nas áreas metropolitanas (68,8%) do que nas urbanas (63,8%) e rurais (45,8%), segundo cálculo do Banco Mundial com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) 2004-2012 – levantamento anual realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para verificar características demográficas e socioeconômicas da população brasileira.
Em outras palavras, enquanto os pobres* representavam 24,6% da população rural e 7,2% da população urbana, eles eram apenas 4,6% da composição das regiões metropolitanas (RMs). O cenário nas grandes cidades também é positivo para os extremamente pobres – taxas de 2,3% nas RMs, em comparação com 2,8% nas áreas urbanas e 9,4% nas áreas rurais – e para os vulneráveis – taxas de 11,3% nas RMs, em comparação com 14,7% no meio urbano e 25% no meio rural.
Os dados estão reunidos no estudo inédito Pobreza e prosperidade compartilhada nas principais regiões metropolitanas brasileiras (em inglês), lançado em 12 de junho no evento Diálogos sobre a questão metropolitana no Brasil. Segundo a pesquisa, a diminuição da pobreza nas 10 maiores RMs brasileiras foi possível graças ao aumento da renda, responsável por dois terços dessa redução, e às políticas de redistribuição de renda, responsáveis por um terço.

Aude-Sophie Rodella, especialista em pobreza do Banco Mundial, destaca a importância da renda laboral para a diminuição da pobreza nas metrópoles

“A contribuição da renda laboral teve um impacto grande na pobreza, porque a renda dos mais pobres cresceu mais que a renda dos mais ricos. Isso significa que a prosperidade compartilhada funcionou muito bem nas RMs”, analisa Aude-Sophie Rodella, economista do Setor de Pobreza do Banco Mundial para a América Latina e o Caribe e responsável pela apresentação do estudo.
Apesar dos avanços, a pobreza ainda é bastante heterogênea entre as regiões do país – as  RMs do Norte e Nordeste continuam a ter os maiores índices (com taxas ao redor de 8%), enquanto as localizadas no Sul e Sudeste apresentam as menores taxas (mais próximas de 3%).
A desigualdade também é explícita dentro das próprias áreas metropolitanas (leia a matéria aqui), com variações de renda e de acesso a serviços e ao mercado de trabalho entre o centro e a periferia. A qualidade dos serviços básicos, por exemplo, difere entre as classes alta e média e entre os pobres e vulneráveis.
Enquanto o saneamento é acessado por quase 100% da classe média das RMs, essa porcentagem cai para 80% para os extremamente pobres e vulneráveis, e para 73% para os pobres – os programas de proteção social no Brasil melhoraram, nos últimos anos, o acesso da população extremamente pobre a serviços, o que garante números melhores para essa categoria do que para a população pobre.
A educação é outro indicativo de desigualdade: a taxa de escolaridade secundária é próxima de 40% para a classe média, de 30% para os extremamente pobres e vulneráveis, e inferior a 20% para os pobres.
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70% são negros; 80%, desempregados – O relatório avalia a raça como um “forte determinante de pobreza” nas metrópoles – onde 7 em cada 10 pobres e extremamente pobres são afrodescendentes – e o desemprego como um indicativo de exclusão das camadas sociais mais vulneráveis nesses ambientes – mais de 80% dos extremamente pobres não têm emprego; e os que possuem uma atividade trabalham na informalidade, em contraste com apenas 40% dos vulneráveis e 20% da classe média.
“Praticamente 90% da redução da pobreza deveu-se à renda oriunda do trabalho, fato esse que, combinado ao acesso limitado a empregos de qualidade, sugere que apenas poucas das famílias extremamente pobres têm a oportunidade de sair dessa situação através dos mercados de trabalho”, diz a pesquisa.
Segundo Aude-Sophie, o desemprego entre pobres e extremamente pobres é um desafio para o enfrentamento da pobreza nas regiões metropolitanas brasileiras. “Podemos ter mais resultados pensando melhor nos gargalos que os pobres têm de acesso ao mercado laboral. E entender melhor as diferenças entre as RMs pode ajudar a definir políticas públicas de redução da desigualdade.”
Pronatec – Um caminho adotado pelo governo brasileiro para melhorar as oportunidades e o acesso ao mercado de trabalho pelos pobres e extremamente pobres é o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), ofertado pelo plano Brasil sem Miséria.
De 2011 a 2014, o programa recebeu 1,75 milhão de matrículas, com a maioria do público formada por mulheres (68%), jovens de 18 a 29 anos (49%) e negros (53%). São 630 cursos em mais de 3,5 mil municípios. “Mais de 70% das pessoas foram colocadas no mercado formal depois do curso do Pronatec”, afirma Patrícia Vieira da Costa, diretora de Relações Institucionais do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
Patrícia destaca ainda que 25% do público formalizado pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) – entidade privada sem fins lucrativos que oferece capacitações para os micro e pequenos negócios do Brasil – como microempreendedor individual (1,3 milhão de pessoas) são registrados no Cadastro Único e que 10% (525 mil pessoas) são beneficiários do Programa Bolsa Família.
*O estudo considerou os parâmetros de pobreza utilizadas pelo Programa Bolsa Família e pelo Plano Brasil sem Miséria – a partir de acordos do Banco Mundial para o Brasil com autoridades brasileiras, essas linhas são utilizadas na base de dados dos Indicadores do Desenvolvimento Mundial. Os parâmetros considerados pelo estudo estipulam a extrema pobreza na faixa de renda igual ou inferior a R$ 77 por pessoa e a pobreza entre R$ 77 e R$ 154 por pessoa.
Para definir a população vulnerável (aquela em risco de cair em situação de pobreza) e a classe média (aquela em escala ascendente), o estudo levou em consideração os limiares estabelecidos em 2013 pela Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Eles indicam a vulnerabilidade na faixa de renda mensal entre R$ 140 e R$ 291, por pessoa, e a classe média com renda mensal acima de R$ 291 por pessoa – de R$ 291 a R$ 441 por pessoa (classe média baixa), de R$ 441 a R$ 641 por pessoa (classe média) e de R$ 641 a R$ 1.019 por pessoa (classe média alta). 
Perguntas para Aude-Sophie
WWP: O estudo mostra que, apesar de o Brasil ter conseguido reduzir significativamente a pobreza e a extrema pobreza nas regiões metropolitanas, o ambiente metropolitano brasileiro é bastante desigual entre extremamente pobres e a classe média. Quais são os principais desafios para que a população pobre e extremamente pobre consiga sair dessa condição social?
Aude-Sophie Rodella: Por um lado, os pobres que vivem em áreas metropolitanas têm uma melhor cobertura em termos de serviços e de potenciais oportunidades de emprego do que aqueles que vivem em áreas rurais e áreas urbanas não-metropolitanas; no entanto, eles também enfrentam um maior custo de vida, sendo diretamente confrontados com o déficit habitacional do Brasil, normalmente vivendo em situação mais precária.
Muitas vezes esse cenário combina-se com uma maior exposição ao crime e à violência do que os grupos de renda mais alta. Tudo isso pode afetar suas capacidades de efetivamente acessarem essas oportunidades. Além disso, a mobilidade intrametropolitana deles também pode ser restrita, por exemplo, de acessibilidade, disponibilidade, tempo de deslocamento, etc, de modo a limitar a capacidade de aproveitar o que as áreas metropolitanas têm para oferecer em termos de oportunidades e serviços.
Além disso, os pobres vivendo em tais condições são mais diretamente dependentes de mercados de trabalho que ofereçam empregos para as suas habilidades. Com a renda oriunda do trabalho sendo tão dominante na redução da pobreza, especialmente na condição metropolitana, uma mudança na composição dos mercados de trabalho – seja em termos do número de postos de trabalho, como visto recentemente, ou para setores que empregam perfis mais qualificados do que os encontrados entre os pobres e vulneráveis – pode ter efeitos negativos que são mais rápidos e maiores a se manifestar em configurações metropolitanas.
Aliás, o relatório Pobreza e Prosperidade Compartilhada nas Principais Regiões Metropolitanas Brasileiras (em inglês) destaca quatro áreas onde mais pesquisas especializadas são necessárias para informar políticas e programas públicos urbanos e metropolitanos que visem diretamente a redução da pobreza e aqueles que poderiam ter um impacto com uma melhor inclusão destas questões no planejamento e implementação.
São elas: entender os desafios enfrentados pelos pobres no acesso a empregos de qualidade, entender as diferenças na redução de desigualdades entre as RM’s, entender as carências na prestação de serviços tanto no acesso quanto na qualidade, e entender a dinâmica espacial das RM’s, suas especificidades regionais e o papel desempenhado pela mobilidade urbana no efetivo acesso a serviços e a oportunidades de trabalho.
WWP: Há disparidades entre as RM’s do Norte e do Nordeste com as RM’s do Sul e do Sudeste, e que interferem nas taxas de superação da pobreza. De que forma a cooperação federativa poderia auxiliar a diminuir a pobreza no Brasil como um todo?
ASR: A pobreza tem sido tradicionalmente maior no Norte e Nordeste, e enquanto todas as RMs tiveram um declínio [nas taxas de pobreza] nos últimos anos, tem sido observada uma convergência progressiva das RMs nessas regiões na última década. Ainda assim, elas continuam a enfrentar maior incidência de pobreza e elevada desigualdade que exigirá uma colaboração continuada entre todos os níveis de governo para sustentar os ganhos obtidos e enfrentar os desafios restantes.
Uma melhor inclusão das questões de pobreza e desigualdade nos níveis de governo envolvidos nesses setores poderia ampliar os potenciais impactos sobre a pobreza, alcançando além dos ambiciosos programas sociais do Brasil, que abriram os caminhos para uma série de ganhos, mas que precisam ser mais sistematicamente retransmitidos pelos outros setores-chave.
Marianna Rios, WWP