Do apoio à agricultura familiar até alimentação escolar, representantes da Ásia, África e América do Sul revelam o que aprenderam em visita ao Brasil

Brasília, 20 de maio de 2016 – “O Brasil conseguiu sair do Mapa da Fome da ONU e nós estamos aqui para ver como podemos adaptar essa experiência ao nosso contexto para um dia também sair do Mapa da Fome”. A frase, de uma gestora de Burkina Faso, na África, mostra uma das razões pelas quais especialistas e formuladores de políticas públicas de diversos continentes procuram o Brasil para conhecer seu sistema de proteção social. Mas após a visita de delegações estrangeiras – foram 455 nos últimos seis anos – o que fica de aprendizado?

Aproveitando a passagem de mais de 150 gestores internacionais pelo XI Seminário Internacional Políticas Sociais para o Desenvolvimento, a Iniciativa Brasileira de Aprendizagem por um Mundo sem Pobreza (World without Poverty, WWP) perguntou aos  presentes o que faz a experiência brasileira ser referência mundial.

As respostas revelam pontos de vistas adaptadas à realidade política e institucional de cada país.

Para o Uruguai, por exemplo, a participação da sociedade civil em políticas de segurança alimentar é destaque; para o Quênia, o fato dos programas estarem amparados juridicamente.

Dentre os temas apresentados no Seminário, realizado pelo Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, estavam os principais eixos do sistema de proteção social do Brasil, passando pelo Cadastro Único, a gestão da informação, a assistência social e a segurança alimentar.

Esse último tema despertou grande interesse dos visitantes, principalmente após a visita à Central de Abastecimento do Distrito Federal (Ceasa-DF), grande mercado de produtos agrícolas na capital do país que integra o sistema de segurança alimentar.

Lá, agricultores familiares que recebem incentivos do poder público para aumentar a produtividade podem vender seus produtos a pequenos e médios comerciantes. Além disso, o próprio governo pode comprar esses produtos por meio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), para consumo de entidades de assistência social, como creches, orfanatos e asilos.

Veja ainda por que pessoas do mundo inteiro vêm ao Brasil conhecer as políticas sociais do país

Confira os pontos destacados nos depoimentos dos gestores.

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“Como país, estamos implementando uma série de programas sociais. Temos quatro programas de transferência de renda. Também estamos executando um programa de alimentação escolar em terras áridas e semiáridas. E nós temos tentado criar várias inovações para aumentar a eficiência de todos eles. Por exemplo, temos um registro biométrico para a transferência de renda e estamos caminhando para a segmentação digital. Mas nós sentimos que, mesmo com tudo isso, precisávamos ver o que outros países estavam fazendo. Escolhemos o Brasil porque ele está bem avançado. E, de fato, aprendemos muito. A maioria das coisas que vocês estão fazendo aqui é previsto em legislações ou políticas públicas. Isso não é o caso no nosso país. Além disso, quando se trata de programas de transferência de renda, somente um, para crianças vulneráveis, tem condicionalidades. Podemos colocar condicionalidades a partir de agora, mas verei o que minha delegação vai decidir. Aqui no Brasil, vocês estão também muito bem organizados em termos de estrutura de governança. Vocês têm várias comissões e conselhos em cada órgão, por exemplo. Em meu país, não temos isso. ”

Cecilia Mbaka, do Quênia
Chefe da Secretaria de Proteção Social

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“Tratando-se de proteção social, o Brasil tem atingido metas em um curto espaço de tempo, o que tem chamado a atenção de Moçambique para as estratégias usadas para reduzir indicadores como desnutrição crônica, pobreza e insegurança alimentar. Nestes dias em que estamos aqui, o que mais me chamou a atenção é o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Já temos uma experiência que está a ser implementada em Moçambique de alimentação escolar, mas há sempre novos desafios. Por exemplo, esta abordagem do Brasil de usar o PAA para mercados sociais, não só para a alimentação escolar, nos faz pensar sobre como podemos produzir alimentos através de nossa agricultura familiar para hospitais, orfanatos, etc., e também quartéis. Pode-se aproveitar o trabalho dos agricultores familiares para alimentar esses setores. Na Ceasa (Central de Abastecimento do Distrito Federal), uma das melhores coisas que vi é a própria estruturação do Banco de Alimentos, com o desperdício zero. Em Moçambique, nós vemos a perda de alimentos que ainda poderiam ser aproveitados”.

Edgar Cossa, de Moçambique
Chefe do Departamento de Promoção de Segurança Alimentar

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“O Brasil é uma das referências que temos em políticas sociais na América Latina e acho que é o que mais tem feito progressos na questão da segurança alimentar. Fiquei muito impressionado com o sistema de trabalho com a sociedade civil. Que ela possa participar da segurança alimentar e definir políticas é um avanço. O fato de que o Estado articule para que a sociedade civil seja parte da política social me parece muito importante. A experiência do Brasil neste sentido me parece a melhor, porque as políticas sociais têm apoio da sociedade. Além disso, o que chama a atenção é o nível de alcance das políticas em um território tão grande. O Brasil é um continente.”

Manuel Vásquez, de Uruguai
Ministério do Desenvolvimento Social do Uruguai

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“Estamos aqui realmente para nos inspirar com a experiência brasileira em matéria de política de proteção social e também em segurança alimentar e nutricional. O Brasil conseguiu sair do Mapa da Fome (da ONU), e nós estamos aqui para ver como podemos adaptar essa experiência ao nosso contexto para um dia também sair do Mapa da Fome e levar o nosso povo na direção da segurança alimentar e nutricional. Nas visitas e durante todos estes dias aqui, o que me marcou muito é a experiência do Brasil nas cantinas escolares. Vocês estão realmente avançados em relação a isso. Por exemplo, ao considerar a nutrição na dieta das crianças, com a contribuição de nutricionistas para melhorar a qualidade da alimentação dos alunos. Esta é uma grande lição para nós. Eu espero que em alguns anos vamos voltar aqui para compartilhar com vocês a lição aprendida e como conseguimos infundir esse novo dinamismo da experiência brasileira em Burkina Faso. ”

Benedicta Ouedraogo Akotionga, de Burkina Faso
Secretária-executiva do Conselho Nacional de Segurança Alimentar

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“No Senegal, temos um sistema de proteção social que tentamos modelar de acordo com o do Brasil. O que eu aprendi de mais interessante é o desenvolvimento da agricultura familiar. O Estado ajuda essas famílias para dar a elas autonomia e para que escapem da pobreza pela via da aquisição de terras e de empréstimos para a agricultura, o que é muito importante.”

Dr. Rokhaya Diakhate, do Senegal
Responsável pela Delegação Geral de Proteção Social e de Solidariedade Nacional

china

“O sistema de assistência social no Brasil é melhor do que pensamos. Há duas coisas que eu achei muito interessantes: a primeira são os empréstimos a pequenos agricultores. Eles têm a oportunidade de trabalhar e ter uma vida melhor. A segunda é o restaurante onde as pessoas podem ir, almoçar e só pagar R$ 3. Na China, temos restaurantes como esse apenas para as pessoas mais velhas, não para a população mais pobre em geral. O monitoramento daqui também é muito bom.”

Chen Xunchui, da China
Vice-diretor administrativo do Centro de Monitoramento e Verificação de Famílias de Baixa Renda do Ministério de Assuntos Civis da República Popular da China

madagascar

“O que é interessante no Brasil para nós é a integração de todas as partes envolvidas. Ou seja, não é um caso de apenas um ministério. Não se trata apenas do aumento da renda, mas há muitas coisas em torno disso: alimentação, educação, saúde, energia. O mais importante para mim é a coordenação de todos e, especialmente, o compromisso do Estado com a implementação do programa (Brasil Sem Miséria), o que não é nada fácil”.

Irenée Arimanana Ravelojaona, de Madagascar
Diretora de Resposta a Choques e Proteção contra Riscos Sociais do Ministério da População da Proteção Social e de Promoção da Mulher

 

Confira ainda este vídeo que resume em poucos minutos o XI Seminário Internacional Políticas Sociais para o Desenvolvimento:

Marco Prates, WWP